Dados inéditos do Censo Demográfico 2010 mostram que quase
70% da população brasileira têm relacionamentos amorosos com pessoas do mesmo
grupo de cor ou raça, o que representa uma queda estatística de cerca de 1% em
relação ao levantamento censitário feito em 2000. Os números sobre endogamia
fazem parte da amostra "Nupcialidade, fecundidade e migração",
divulgada nesta quarta-feira (17) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística).
O estudo aponta que a maioria dos brancos (69,3%) se une a
pessoas do mesmo grupo de cor ou raça. Entre os pretos (na classificação do
IBGE, pretos e pardos são subdivisões raciais que representam os negros), menos
da metade da população (45,1%) têm relacionamentos com indivíduos da mesma cor.
Pardos (68,5%) e indígenas (65%) completam a lista.
PERCENTUAL DAS UNIÕES DE PESSOAS DE 10 ANOS OU MAIS, SEGUNDO
A ESCOLHA DO HOMEM
As estatísticas variam pouco quando consideradas as escolhas
feitas por homens e mulheres. Cerca de 75,3% dos homens brancos se relacionam
com pessoas do mesmo grupo de cor ou raça; entre as mulheres, o dado
estatístico cai aproximadamente dois pontos percentuais.
A disparidade é um pouco maior quanto aos pretos: o IBGE
registrou índices de 39,9% em relação aos homens e 50,3% referente às mulheres.
Pardos e indígenas, por sua vez, estão bem próximos no desdobramento
estatístico por gênero.
PERCENTUAL DAS UNIÕES DE PESSOAS DE 10 ANOS OU MAIS, SEGUNDO
A ESCOLHA DA MULHER
A amostra revela ainda que a união consensual é maioria
entre os negros: 46,6% em relação aos pretos e 42,6% acerca dos pardos. Entre
os negros que afirmaram estar casados, as estatísticas variam na faixa dos 30%.
Mais da metade (51,9%) da população branca, por sua vez, declarou ter optado
pelo matrimônio (civil e religioso).
DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DOS TIPOS DE UNIÃO
Escolaridade
O IBGE também analisou a escolha de parceiros segundo
critérios de escolaridade, e descobriu que a maioria dos homens (82,9%) e das
mulheres (85,3%) sem instrução e fundamental incompleto se relacionam com
pessoas com a mesma situação educacional.
No geral, 68,2% das pessoas uniram-se a outras de mesmo
nível de instrução (em 2000, esse percentual era de 63,0%), sendo que 47% dos
homens com diploma universitário escolhem parceiras com o mesmo grau de
escolaridade. No caso das mulheres, esse índice sobe para 51,2%.
Brancos ganham o dobro
Os dados do Censo 2010 mostram que a desigualdade racial
continua no Brasil, com brancos recebendo salários mais altos e estudando mais
que os negros (pretos e pardos).
Segundo o levantamento, essa realidade é ainda mais
acentuada na região Sudeste, onde os rendimentos recebidos pelos brancos
correspondem ao dobro dos pagos aos pretos. A menor diferença é observada na região
Sul, onde a população branca ganha 70% mais que aquela que se autodeclarou
preta.
ENSINO SUPERIOR
31,1% brancos
13,4% pardos
12,8% pretos
De acordo com Jefferson Mariano, analista socioeconômico do
IBGE, esses indicadores pouco mudaram com o passar dos anos. “Nós até
observamos uma redução da desigualdade nesse aspecto, mas a queda é muito
tímida”, diz.
Para a o analista, a cidade de São Paulo serve como um
“ótimo exemplo” dessas desigualdades. “A população do Alto de Pinheiros [bairro
da zona oeste], por exemplo, é majoritariamente branca, enquanto em Parelheiros
[bairro no extremo da zona sul] predomina a população negra."
“O rendimento médio domiciliar per capita de Parelheiros
corresponde a 10% do rendimento dos moradores do Alto de Pinheiros. Não por
acaso, a população negra do Alto de Pinheiros, assim como a branca de
Parelheiros, é inexpressiva”, afirma Mariano, citando dados do IBGE.
O Censo 2010 mostra que os brancos também dominam o ensino
superior no país: considerando a faixa etária entre 15 e 24 anos, 31,1% da
população branca frequentava a universidade. Em relação aos pardos e pretos, os
índices são de 13,4% e 12,8%, respectivamente.
A pesquisa observou ainda diferenças relevantes na taxa de
analfabetismo entre as categorias de cor e raça. Enquanto para o total da
população a taxa de analfabetismo é de 9,6%, entre os brancos esse índice cai
para 5,9%. Já entre pardos e pretos a taxa sobe para 13% e 14,4%, respectivamente.
População negra aumenta
Embora a população que se autodeclara branca ainda seja
maioria no Brasil, o número de pessoas que se classificam como pardas ou pretas
cresceu, enquanto o número de brancos caiu, diz o levantamento do IBGE.
O percentual de pardos cresceu de 38,5%, no Censo de 2000,
para 43,1% (82 milhões de pessoas) em 2010. A proporção de pretos também subiu
de 6,2% para 7,6% (15 milhões) no mesmo período. Por outro lado, enquanto mais
da metade da população (53,7%) se autodeclarava branca na pesquisa feita dez
anos antes, em 2010 esse percentual caiu para 47,7% (91 milhões de
brasileiros).
De acordo com o analista do IBGE, essa inversão faz parte de
uma mudança cultural que vem sendo observada desde o Censo de 1991. “Muitos que
se autodeclaravam brancos agora se dizem pardos, e muitos que se classificavam
como pardos agora se dizem pretos. Isso se deve a um processo de valorização da
raça negra e ao aumento da autoestima dessa população”, diz Mariano.
O analista, no entanto, afirma que “o Brasil ainda é racista
e discriminatório”. “Não é que da noite para o dia o país tenha deixado de ser
racista, mas existem políticas. As demandas [da população negra], a questão da
exclusão, tudo isso começou a fazer parte da agenda política. A cota racial em
universidades, por exemplo, é um desdobramento disso”, afirma Mariano.
Censo 2010
Participaram do Censo 2010 cerca de 190 mil recenseadores,
que visitaram os mais de 5.565 municípios brasileiros entre 1º de agosto a 31
de outubro de 2010. Os primeiros dados da pesquisa, que identificou uma
população de 190 milhões de brasileiros, foram divulgados em abril de 2011. Ao
longo de 2012, estão sendo produzidos novos resultados, apresentados em volumes
temáticos. (Com reportagem de Débora Melo, em São Paulo)